21/09/2022
O cenário de demanda em alta, escassez do produto, alto valor agregado e preços elevados representa a oportunidade perfeita para empresas adulterarem esse produto — e ampliarem a margem de lucro.
Para fugir dessas ameaças, os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil orientam que o consumidor leia atentamente o rótulo e priorize azeites fabricados e envasados em um mesmo local há menos de seis meses. Ao longo desta reportagem, você vai entender todos os motivos por trás dessas e de outras recomendações. As dicas e orientações, para não comprar gato por lebre, estão no final da reportagem.
Um indício do impacto das fraudes vem das operações periódicas feitas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa): a última delas, realizada em dezembro de 2021, desarticulou uma rede de fraudadores que atuava em todo o país, apreendeu mais de 150 mil garrafas e proibiu a venda de 24 marcas deste produto.
Em anos anteriores, outras investigações do tipo chegaram a observar que entre 40 e 60% dos lotes de azeites analisados não passavam nas avaliações de qualidade.
Outra evidência que revela o tamanho do problema vem da Proteste, uma associação de consumidores que acompanha esse setor desde 2002.
“Em 17 anos, nós realizamos nove rodadas de testes que levaram em conta diversas marcas de azeite disponíveis no mercado”, resume a nutricionista Fernanda Taveira, especialista em Alimentação e Saúde da Proteste. “E podemos perceber que, com o avanço da fiscalização, houve uma redução no número de fraudes.”
Na primeira rodada de testes, em 2002, os especialistas da organização avaliaram 15 marcas e encontraram cinco fora do padrão. Já em 2019, foram investigadas 50 opções, das quais cinco vendiam gato por lebre.
Esses dados ganham ainda mais importância diante do protagonismo que o azeite vem ganhando na mesa dos brasileiros: o país ocupa atualmente a segunda posição entre os maiores importadores desse produto no mundo, atrás dos Estados Unidos.
Na safra 2014/15, o país comprou 67 toneladas de azeite do exterior. Esse número segue em crescimento e atingiu as 104 toneladas em 2019/20, de acordo com os relatórios do Conselho Oleícola Internacional (COI).
O consumo de óleos “alterados” em geral não representa uma ameaça direta à saúde. Mas especialistas e associações criticam o fato de os consumidores serem enganados — afinal, eles acham que compraram um azeite de oliva, alimento associado a diversos benefícios alimentares, quando, na verdade, estão levando um óleo barato e com outra composição de nutrientes.
Claro que, nesse contexto, há casos mais sérios. O nutricionista Dennys Esper Cintra, coordenador do Laboratório de Genômica Nutricional da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), lembra que, no início dos anos 2000, foram identificados casos raros de azeites adulterados com óleo velho de motor de carro.
“A ideia dos produtores era acrescentar esse ‘ingrediente’ e escurecer um pouco o produto, para que ele ficasse mais parecido com o azeite de verdade, o que é extremamente grave”, lembra.
Mas o que faz esse produto ser um alvo fácil de fraudes? Como fugir de pegadinhas no supermercado? E como escolher o melhor tipo e tirar o máximo proveito tanto do ponto de vista da saúde quanto da culinária?
Para entender os motivos por trás das fraudes, é preciso conhecer antes os tipos de azeite e como eles são obtidos.
Em linhas gerais, esse alimento é dividido em quatro categorias: o extravirgem, o virgem, o azeite tipo único e o lampante.
Vamos começar pelo extravirgem. “Aqui só entra o que foi produzido de melhor em todas as etapas. A fabricação desse óleo depende apenas de processos mecânicos, sem nenhuma adição química ou alteração de calor”, explica Ana Maria Rauen Miguel, pesquisadora do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.
Ou seja: as azeitonas são colhidas no momento exato e passam pela maceração e pela prensa em temperatura ambiente, etapas que permitem extrair a primeira leva de óleo do fruto. Esse líquido passa então por alguns processos básicos para retirar impurezas e é engarrafado puro.
Do ponto de vista da legislação, o extravirgem possui um nível de acidez que fica abaixo de 0,8%.