Os dados mostram ainda que no Ministério do Meio Ambiente os investimentos em estudos sobre mudanças climáticas foram zerados a partir de 2019.
A política ambiental do governo Bolsonaro é alvo de críticas domésticas e internacionais. Por outro lado, ele é apoiado por diversos setores do agronegócio e da mineração. Em sua campanha, em 2018, ele prometeu acabar com o que chamava de “indústria das multas” ambientais.
Em 2019 e 2020, o Brasil registrou as piores taxas anuais de desmatamento desde 2008. No período, foram desmatados mais de 20 mil quilômetros quadrados, uma área equivalente a 13 cidades de São Paulo. O avanço do desmatamento e dos incêndios florestais nesses dois anos despertaram reações de organizações não-governamentais e de chefes de estado estrangeiros como o presidente da França, Emmanuel Macron.
A posição de Bolsonaro em relação às mudanças climáticas também é fruto de críticas de ambientalistas e cientistas. Em 2019, após a COP-25, por exemplo, Bolsonaro chegou a afirmar que a pressão internacional em torno do assunto seria parte de um “jogo comercial” com o objetivo de prejudicar países em desenvolvimento como o Brasil.
“Eu quero saber… alguma resolução para a Europa começar a ser reflorestada? Alguma decisão? Ou só ficam perturbando o Brasil? É um jogo comercial, eu não sei como o pessoal não consegue entender que é um jogo comercial”, disse o presidente.
O ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo, que ficou no cargo janeiro de 2019 a março de 2021, chegou a colocar em dúvida que as mudanças climáticas seriam causadas pela ação humana, na contramão do consenso da comunidade científica.
“Há mudanças climáticas? Sim, certamente, sempre teve. É causada pelo homem? Muitas pessoas dizem que sim, não sabemos com certeza”, disse o ex-chanceler em um evento nos EUA, em setembro de 2019.
Foi apenas em 2020, em meio a críticas internacionais, que Salles determinou a recriação de uma secretaria dedicada às mudanças climáticas dentro do ministério. Salles deixou o cargo em junho deste ano em meio a investigações sobre seu suposto envolvimento com um grupo de empresários que faria contrabando de madeira da Amazônia.
Críticas
Especialistas ouvidas pela BBC News Brasil criticaram os cortes nos investimentos do governo em estudos sobre as mudanças climáticas. Segundo elas, o governo Bolsonaro prejudicou a política climática do país.
Para Natalie Unterstell, presidente do think tank Talanoa, os números mostram que os investimentos aquém da necessidade do Brasil para lidar com a crise climática.
“Estudos recentes mostram que o mundo deveria investir pesado em estudos e projetos para mitigar os efeitos da mudança climática. Esses cortes comprometem a forma como o Brasil se prepara. Isso mostra que ela não é prioridade para um órgão que deveria ser um importante formulador de políticas públicas. Isso é um reflexo da paralisação da agenda ambiental o governo que se deu dentro do MMA e a partir dele”, diz Natalie.
“Um olhar para o esvaziamento da ação orçamentária referente ao fomento a projetos para mitigação e adaptação à mudança do clima mostra bem isso. Em 2021, foram empenhados na ação orçamentária 20G4 míseros R$ 110 mil reais até agora. Para 2022, estão previstos pouco mais de 500 mil reais. Nesses números fica patente a desatenção ao tema”, afirmou a ex-presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e pesquisadora sênior do Observatório do Clima, Suely Araújo.
A BBC News Brasil enviou questionamentos para o Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações e para a Presidência da República sobre os cortes. Nenhum dos três se pronunciou sobre o assunto.