30/04/2024
Reproduzimos, a seguir, reportagem do portal Rede Brasil Atual, referente ao trabalho divulgado pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos – Inesc, nesta segunda-feira, 29 de abril.
Análise do Inesc sobre o orçamento 2023 indica que o novo regime fiscal, apesar de não tão duro como o teto de gastos, e as limitações na retomada de políticas extintas, afetaram setores essenciais, como saúde, educação e meio ambiente.
A saúde indígena, abandonada anteriormente, teve um ganho notável. Mas segundo o Inesc, a saúde em geral ainda é penalizada com restrições fiscais
Estudo sobre o orçamento da União de 2023 divulgado nesta segunda-feira (29) aponta que a saúde, a educação, meio ambiente e outros sete setores foram afetados pelo novo regime fiscal. De autoria do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), a análise reconhece os esforços no primeiro ano de governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para recompor políticas sociais e ambientais que sofreram desmonte na gestão anterior. Mas conclui que, apesar dos esforços, não surtiram os efeitos desejados.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores da organização analisaram a aplicação de recursos públicos federais em saúde educação direito à cidade, energia, meio ambiente, indígenas, quilombolas, igualdade racial, mulheres e crianças e adolescentes. A equipe contextualizou o ambiente econômico, a execução financeira de 2023 e o orçamento previsto para 2024.
O Inesc detectou que mesmo quando havia recurso previsto, havia dificuldade para executar. Isso devido à dificuldade para recompor as equipes e à morosidade na celebração de convênios com os entes estaduais e municipais.
“Não é uma tarefa fácil, diante do desmonte operado pela governo anterior. No entanto, é preciso ressaltar que temos muito o que avançar em termos de proteção, defesa e promoção de direitos, principalmente, nos grupos de indígenas, mulheres, negros e negras, assim como de crianças e adolescentes”, disse Cléo Manhas, assessora política do Inesc.
Segundo ela, para além da baixa execução em alguns casos, outro ponto que chama a atenção em relação à aplicação dos recursos federais em 2023 e no planejado para 2024 para a garantia de direitos é subordinação à política fiscal. “O Teto dos Gastos foi substituído por um novo regime fiscal, que, apesar de menos prejudicial, ainda impõe restrições em áreas cruciais como saúde e educação”, disse. “Merece atenção o novo Plano Plurianual (PPA) para o período 2024-2027, com um orçamento previsto em R$ 13,3 trilhões e objetivos transversais que incluem crianças e adolescentes, mulheres, igualdade racial, povos indígenas e meio ambiente.”
Em 2023 foram aplicados R$ 176,9 bilhões, representando um aumento significativo de R$ 27,5 bilhões em termos reais ou 18% em relação ao ano anterior;
Para 2024, está previsto orçamento de R$ 217,7 bilhões para o setor, um aumento de 18%, com destaque para a ampliação de despesas discricionárias do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na área da saúde, com variação de 16.887% em relação a 2023.
Houve um aumento de cerca de 20% no orçamento autorizado para o Ministério da Educação, que passou de R$ 142,2 bilhões em 2022 para R$ 169,1 bilhões em 2023. Em 2023, foram executados 17% a mais de recursos em relação a 2022 (R$ 137,6 bilhões em 2022 e R$160,1 bilhões em 2023);
A Educação de jovens e adultos (EJA) teve uma execução financeira quase três vezes maior que em 2022 (de R$ 14,9 milhões para R$ 39,5 milhões). No entanto, ainda há muitos desafios devido ao anterior abandono da política;
A Educação infantil também recebeu mais recursos em 2023, com execução de R$ 761,4 milhões, cerca de R$ 300 milhões a mais do que no ano anterior;
Uma boa novidade foi o Pé-de-Meia, programa de incentivo à permanência e à conclusão escolar para o Ensino Médio público;
A educação superior também recebeu mais recursos, que ficaram em torno de R$ 40 bilhões. No entanto, ainda é insuficiente para o tamanho do desafio. Esses recursos são semelhantes a 2014, quando o orçamento começou a cair. Além da recuperação são necessários mais recursos para atender as demandas reprimidas.
Os recursos investidos em saneamento básico cresceram quase 40 vezes entre 2022 e 2023, saindo dos R$ 3,4 milhões para R$ 135,58 milhões de execução financeira. Apesar do aumento, esse valor, em 2023, representou 12% do total autorizado;
No programa “Moradia Digna”, também houve um salto notável, de um pouco menos de um milhão de reais em 2022 para quase R$ 10 bilhões, em 2023. Neste caso, 96% do recurso autorizado para 2023 foi executado;
O Programa Minha Casa Minha Vida retornou e está garantindo recursos para Habitação de Interesse Social, ou seja, para quem recebe Bolsa Família e BPC e também para famílias da Faixa 1, que têm renda de até R$ 2.600,00. No governo anterior os financiamentos foram direcionados para as rendas mais altas, a partir da Faixa 2;
No recém criado Ministério das Cidades como um todo, foram executados R$ 11,3 bilhões, o que equivale a 57% do recurso autorizado.
O Inesc analisou a execução financeira dos programas de energia é focada na geração distribuída com ênfase social. Deste modo, a transição energética considera, além da diversificação das fontes de energia, os impactos sociais e ambientais, a geração de empregos e o desenvolvimento socioeconômico das comunidades afetadas;
Ainda que o Brasil esteja se destacando internacionalmente como líder na transição energética, ainda persiste no governo uma contradição nas políticas públicas para esse fim;
A análise do orçamento do Ministério de Minas e Energia (MME) revela que, apesar de recursos para incentivar a geração de eletricidade renovável, foram insignificantes (R$ 525 mil) e não houve execução nos anos de 2022 e nem de 2023.
Em 2023, o orçamento executado pelos órgãos ambientais ligados ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima foi de R$ 3,29 bilhões, valor praticamente inalterado em relação a 2022;
O Ibama teve uma leve redução na sua execução orçamentária em 2023. Parte significativa do orçamento autorizado em alguns setores permaneceu contingenciada, incluindo no Fundo Nacional do Meio Ambiente e na administração direta do Ministério. Mas para as ações destinadas ao combate ao desmatamento, houve aumento, alcançando um total de R$ 422 milhões;
Para 2024, o orçamento ambiental promete uma elevação significativa nas operações oficiais de crédito, saltando de R$ 634 milhões em 2023 para R$ 10 bilhões, devido ao novo formato do Fundo Clima e ao lançamento do Plano de Transformação Ecológica pelo Ministério da Fazenda. No entanto, esses recursos, que serão geridos pelo BNDES, não fazem parte do financiamento direto das políticas ambientais.
Apesar da criação do inédito Ministério dos Povos Indígenas (MPI), liderado pela indígena Sônia Guajajara, não houve ações orçamentárias finalísticas sob administração direta do órgão. E a Funai foi responsável pela execução dessas ações. Os gastos do Ministério, na ordem de R$ 10,29 milhões, destinaram-se essencialmente para sua criação e manutenção;
A execução financeira da Funai em 2023 foi de R$ 589,77 milhões, o que está um pouco abaixo da execução financeira em 2022. A queda, mesmo que pequena, acende um alerta para as dificuldades políticas e estruturais do órgão;
Na Saúde Indígena, o esforço realizado em 2023 foi notável. Os recursos autorizados, na casa dos R$ 1,8 bilhão em 2022, tiveram um acréscimo de R$ 400 milhões para 2023. A execução financeira da Saúde Indígena chegou a 95% do recurso autorizado.
Durante a gestão anterior, as comunidades quilombolas foram excluídas do Plano Plurianual (PPA) 2020–2023, o que representou um claro ato de racismo institucional e resultou em menores recursos para políticas públicas voltadas para esse grupo populacional;
Em 2023, o orçamento para a regularização fundiária dos territórios quilombolas foi de R$ 2,4 milhões, uma melhoria em relação ao ano anterior, mas ainda aquém do necessário para uma política pública efetiva. A execução financeira, afetada por reestruturações administrativas, ficou abaixo do esperado;
Além disso, permanece a necessidade de maior investimento em áreas como saneamento e educação.
Para 2023, a gestão anterior não destinou orçamento no Plano Plurianual para a promoção da igualdade racial, mas o governo atual alocou R$ 70,8 milhões, dos quais foram executados R$ 30,5 milhões (43%);
Destaca-se a criação do Ministério da Igualdade Racial, comandado por uma ativista negra, Anielle Franco;
O recurso autorizado para 2024, da ordem de R$ 130,5 milhões, é quase o dobro do que foi alocado em 2023, a ser distribuído em áreas como políticas para quilombolas, juventude negra e combate e superação do racismo, entre outras.
Em 2023, o orçamento inicialmente previsto pelo governo anterior para o enfrentamento à violência contra as mulheres era de apenas R$ 13,6 milhões, considerado o menor em anos. Esse valor subiu para R$ 152 milhões, com uma execução financeira de R$ 83,7 milhões e um empenho de R$ 146,6 milhões;
A criação do Ministério das Mulheres em 2023 revitalizou a política pública para as mulheres, coordenada pela ministra Aparecida Gonçalves, que conseguiu a aprovação da lei da equiparação salarial entre homens e mulheres;
A Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180) em 2023 teve uma execução de 99% do total autorizado, mas as Casas da Mulher Brasileira enfrentaram baixa execução, mas foram efetivas em empenhar 94% dos recursos.
Em 2023, a execução financeira em assistência para crianças e adolescentes (R$ 369,9 milhões) ficou inferior à de 2022, apesar do orçamento maior;
A absoluta maioria dos recursos destinados ao Programa de Erradicação do Trabalho Infantil em 2023 foram empenhados (96%), mas não houve execução financeira;
Em 2023, o governo aportou mais recursos, comparado a 2022, tanto para a Política de Atenção Integral à Saúde da Criança, que inclui o grupo de 0 a nove anos, quanto para a Rede Cegonha, de atenção materno-infantil, que acompanha gestantes e seus filhos até os dois anos de idade. O aumento de um ano para o outro foi de 59% e 93,3% respectivamente.
Para ler o estudo na íntegra, clique aqui.