Por que a América Latina se tornou novo ‘lixão’ dos EUA

17/02/2022

        A reportagem é da BBC Brasil…
Pessoas em lixão
As exportações de lixo dos EUA para a América Latina bateram recorde em 2021

Durante anos, no mundo da política, a América Latina foi considerada “o quintal dos Estados Unidos”, sua “zona de influência”. Agora, grupos ambientalistas da região dizem que se tornou outra coisa: seu lixão.

Desde 2018, os níveis de exportação de resíduos plásticos dos Estados Unidos para a América Latina aumentaram consideravelmente, sendo 2021 o ano em que a maior quantidade de lixo foi exportada desde que se tem registros.

Segundo dados da Last Beach Cleanup, organização ambientalista sediada na Califórnia, até outubro do ano passado, os EUA haviam enviado mais de 89.824.167 kg de resíduos plásticos para os países da região, alguns dos quais receberam o dobro do que em 2020.

A situação levou a plataforma ambiental Gaia, que reúne 130 organizações da América Latina e do Caribe, a publicar um comunicado em dezembro passado exigindo que os governos da região atuem no que considera uma emergência.

“Alertamos que estamos diante de um perigo iminente de contaminação da natureza e violação dos direitos das comunidades de viver em um ambiente seguro para sua saúde e a de seus territórios”, diz o comunicado.

O principal destino das exportações de resíduos plásticos é o México, que de janeiro a outubro de 2021 recebeu cerca de 60.503.460 kg, o que equivale a cerca de 57 contêineres por dia.

No entanto, toneladas de lixo também foram enviadas durante 2021 para Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador, Honduras, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e até Venezuela.

No Brasil, houve uma queda na quantidade de lixo enviada dos EUA, segundo o relatório da Last Beach Clean Up: foram 481 toneladas nos primeiros dez meses de 2021, contra 1,7 mil toneladas em todo o ano de 2000.

Gráfico mostra exportação de lixo pelos EUA

“Os Estados Unidos estão inundando a América Latina com resíduos plásticos, principalmente da Califórnia ao México. Mas, embora a quantidade de lixo que é exportada para o México seja excessiva, a quantidade que é enviada para o resto da América Latina não é menor se compararmos o tamanho dos países e a quantidade de população”, disse Jan Dell, engenheira ambiental e fundadora do Last Beach Cleanup à BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC).

“E não é apenas uma questão de tamanho ou população. É que esses países, na maioria dos casos, já têm problemas suficientes para lidar com seu próprio lixo e processá-lo para ter que lidar também com lixo plástico dos EUA”, acrescenta.

É o caso de países como Honduras, que teve conflitos ambientais com a Guatemala devido à questão do lixo e que até novembro de 2021 recebeu 6.127.221 kg de resíduos plásticos, mais que o dobro dos 2.250.593 kg recebidos em todo o ano de 2020.

“As exportações de resíduos plásticos dos EUA para a América Latina aumentaram fortemente em 2021 em comparação com 2020 e acho que isso se deve às restrições de importação mais rígidas que impuseram na Turquia e na Ásia, mas também pode ser devido à crise de contêineres, que aumentou significativamente o custo do envio de resíduos dos EUA para a Ásia”, diz ela.

A principal razão das exportações, segundo a especialista, é porque é mais fácil (e mais barato) para as empresas americanas enviar o lixo para outros países do que processá-lo e ter que lidar com as regulamentações ambientais americanas ou com os altos custos dos poucos centros de processamento nos EUA.

“No fim das contas, é uma questão de dinheiro. É muito mais barato colocar resíduos plásticos em caminhões e enviá-los em um contêiner para o exterior do que ter que pagar para ir para um aterro sanitário. É mais fácil enviar nosso lixo para outro lugar e ‘todos vivemos felizes para sempre'”, diz ela.

“Além disso, há também o fato de que produzir plástico hoje é muito mais barato do que reciclá-lo. Então, não é um negócio que traga benefícios para as empresas americanas, é mais barato mandar para outro lugar.”

Lixão
É mais fácil (e mais barato) para as empresas americanas enviar o lixo para outros países do que processá-lo, dizem especialistas

El Salvador, que tem poucos centros de processamento de lixo, recebeu cerca de 1.932.206 kg apenas em novembro de 2021.

Para os ambientalistas, a grande questão é o que acontece ou para onde vai o lixo enviado para esses países.

O novo lixão

De acordo com María Fernanda Solís, especialista em questões ambientais da Universidade Andina Simón Bolívar, no Equador, embora as exportações de resíduos plásticos dos EUA para a América Latina venham acontecendo há anos, elas começaram a aumentar com o anúncio da China de que deixaria de receber esses resíduos.

“Em 2018, a China decidiu deixar de ser o lixão do mundo, e foi aí que os EUA encontraram uma via de escape na América Latina”, diz a especialista.

“Com governos enfraquecidos e marcos regulatórios, normativos e jurídicos fracos como em nossos países, a região é um cenário perfeito para importações gigantescas de resíduos plásticos”, diz.

Segundo Dell, outros contextos específicos contribuíram para os recordes alcançados no último ano.

Para ler o complemento da reportagem, acesse o link abaixo.

https://www.bbc.com/portuguese/internacional-60304415

 

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