27/09/2024
Reproduzimos, a seguir, reportagem gerada pela Agência Brasil.
Médico criou em 1923 a Rádio Sociedade do RJ, atual Rádio MEC (Acervo/Agência Brasil)
Fundador de uma das primeiras emissoras radiofônicas no Brasil – a Sociedade do Rio de Janeiro –, precursora da atual Rádio MEC, Edgard Roquette-Pinto nascia há 140 anos, no Rio de Janeiro. Médico legista, professor, antropólogo, etnólogo e ensaísta, ele morreu em 18 de outubro de 1954, aos 69 anos, após uma parada cardíaca.
Em 1922, ano em que foi comemorado o 1º Centenário da Independência do Brasil, ocorreu no Rio de Janeiro, então capital federal, uma grande feira internacional sobre radiodifusão. Na ocasião, Roquette-Pinto comemorou a tecnologia afirmando que aquela era “uma máquina importante para educar o povo”.
Apresentadora das Rádios EBC, Mara Régia – Arquivo/EBC
Para a jornalista e radialista da EBC Mara Régia, Roquette foi um sonhador que nos idos de 1923 idealizou o rádio como a escola dos que não tinham acesso a ela.
“Seu desejo e sua persistência em permitir o acesso de toda a população brasileira a uma forma de educação acessível se traduzem hoje na missão das rádios públicas desse nosso país, unidas cada vez mais por uma comunicação democrática e plural como é o caso das emissoras de rádio da nossa Empresa Brasil de Comunicação (EBC)“, destaca Mara, apresentadora dos programas Viva Maria e Natureza Viva.
>> Ouça aqui: Dia Nacional do Rádio – Viva Maria celebra cantoras que marcaram época
Em 20 de abril de 1923, Roquette fundou a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro. Os equipamentos foram comprados pela Academia Brasileira de CIências. O projeto era levar informação educativa, cultural e científica à população.
Em 1952, com a finalidade de ampliar o número de emissoras na capital federal – as TVs Tupi de São Paulo e do Rio já estavam em funcionamento -, Getúlio Vargas concedeu a Roquette-Pinto um canal de televisão. Porém, a TV Educativa de Roquette-Pinto nunca saiu do papel. Edgard Roquette-Pinto morreria amargurado dois meses após o suicídio de Getúlio Vargas, em 1954.
Três anos depois de fundar a Rádio Sociedade, Roquette-Pinto lançou a revista Eléctron, dedicada à recém-surgida tecnologia do rádio com diagramas de receptores da época. Foi a primeira revista desse segmento no Brasil. Em 1936, ele doou a emissora ao governo brasileiro, especificamente ao Ministério da Educação, transformada então na Rádio MEC.
Roquette-Pinto também foi radioamador e participou de várias associações da categoria, como a Liga dos Amadores Brasileiros de Rádio Emissão (Labre).
Na Academia Brasileira de Letras (ABL), Roquette-Pinto foi o terceiro ocupante da Cadeira 17, eleito em 20 de outubro de 1927, na sucessão de Osório Duque-Estrada. Ele também é homenageado pela Academia Brasileira de Médicos Escritores como patrono da Cadeira 33, cujo fundador é o médico paulista Helio Begliomini.
Pesquisadores apontam o envolvimento de Roquette com o movimento eugenista, mas ponderam que ele defendia a inclusão dos negros e mestiços do processo de “aperfeiçoamento” da nação brasileira.
Em 1936, os aparelhos de rádio já podiam ser comprados em lojas do ramo. Nesse mesmo ano, a Sociedade Rádio do Rio de Janeiro foi doada ao Ministério da Educação e Saúde, que tinha como titular Gustavo Capanema.
Exposição Rádio Sociedade: 100 anos de rádio no Brasil, na Casa da Ciência da UFRJ. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil/Arquivo
Ele comunicou a Roquette-Pinto que a rádio seria incorporada ao Departamento de Propaganda e Difusão Cultural (mais tarde, em 1939, desse departamento surgiria o DIP), órgão responsável pela censura durante parte do governo de Getúlio Vargas.
Em resposta, Roquette-Pinto insistiu que a emissora fosse incorporada ao Ministério da Educação e Saúde, a fim de preservar a função educativa e ganhou a disputa. A Rádio Sociedade passou a se chamar Rádio Ministério da Educação ou, como é hoje conhecida, Rádio MEC, mantendo, até hoje, o ideário educativo.
A Rádio MEC é reconhecida pelo público por sua programação dedicada à música clássica e programas culturais. A emissora dedica 80% de sua programação à música de concerto e leva ao ar compositores brasileiros e internacionais de todos os tempos. Desde 2007, ela é gerida pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Em 5 de julho de 2022, ela foi declarada Patrimônio Histórico e Cultural Imaterial do Rio de Janeiro.
“Toda essa história é marcada por grandes coberturas, valorização da cultura e da educação e programação musical que privilegia a cena brasileira”, destaca o gerente executivo das Rádios EBC, Thiago Regotto.
O professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB) Fernando Oliveira Paulino, que também é presidente da Associação Latino-americana de Pesquisadores da Comunicação Pública (Alaic), disse que ainda hoje, passados mais de 100 anos, o rádio que teve Roquette-Pinto como pioneiro continua sendo grande mecanismo de comunicação, de acesso à tecnologia, de formação do conhecimento.
Professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília, Fernando Paulino. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
“Ao contrário do que muitos pensam, o rádio continua bastante vivo e seguirá certamente usando outras plataformas. Começou com AM, depois FM, depois surgiu o rádio digital. Hoje em dia, a internet, alcançando grande público, setores diferenciados, atuando em situações de necessidade, como o que ocorreu recentemente no Rio Grande do Sul, e agora com a seca e as queimadas, demonstra a importância do rádio como mecanismo do processo de informação”, afirmou.
Paulino citou também algumas especificidades na programação de cada emissora. No caso da Rádio MEC, segundo ele, há um ativo bastante significativo em relação ao acesso à cultura, à programação musical. Ele lembrou também a força da Nacional do Rio de Janeiro, emissora, fundada em setembro de 1936, que deixou um legado em relação aos noticiosos, à música popular brasileira e a tantas pessoas que passaram pela maior emissora da América Latina.
O pesquisador destacou os programadores e intérpretes, nas ondas da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, que compõem ainda a comunicação pública e fazem parte desse patrimônio nacional. “Acho que é essencial valorizar as pessoas que já passaram, que passam e que passarão pelos corredores históricos dessas emissoras que alcançam não só o Rio de Janeiro, mas, especialmente pela internet, o mundo inteiro”.