15/12/2023
Boldrin trouxe dignidade à música caipira, disse um de seus amigos. Apresentador, que morreu no ano passado, era também exímio contador de “causos”.
No palco, com o violão e a companheira Patrícia: o artista e o ser humano eram um só
“Quem não acordou domingo de manhã e escutou a viola?”, pergunta o violeiro e pesquisador Mazinho Quevedo, já cantarolando. “Eu faço isso desde 1980”, completa o artista, para dedilhar e cantar os versos de Vide, vida marvada, o cartão de visitas de Rolando Boldrin, que em cerimônia nesta quinta-feira (14) recebeu título honoris causa da Universidade Estadual Paulista (Unesp).
A homenagem deveria acontecer ainda em vida, mas Boldrin “partiu antes do combinado”, como ele costumava dizer. Morreu em 9 de novembro do ano passado, aos 86 anos. Por sinal, o mesmo dia da partida de Gal Costa.
Durante o evento, a produtora cultural Patrícia Teresa Maia Boldrin, viúva de Rolando, se emocionou várias vezes. Lembrou que o artista e o ser humano eram um só. “Era autêntico, íntegro, sempre ele mesmo. Sobretudo um guardião da história. O Brasil real, de carne e osso, não utópico. (…) O Brasil em que todos éramos um pouco mais de cada um de nós”, afirmou. Mariana e Paula, filhas de Boldrin, também estavam lá.
Patrícia lembrou ainda que Rolando Boldrin não teve oportunidade do ensino formal – seu pai, Amadeu, dizia que escola era para aprender a ler e escrever. “Hoje, esse menino do interior, que cursou apenas o primeiro ano do grupo, recebe o título honoris causa“, completou a produtora, com dificuldade para concluir a fala.
O músico e também apresentador Saulo Laranjeira ressaltou a generosidade de Boldrin com ele e muitos outros artistas, muitos iniciantes. “Boldrin tirou realmente o Brasil da gaveta”, disse Saulo, citando o bordão do programa Sr. Brasil, que o artista apresentava na TV Cultura. “Para trazer dignidade para a música caipira, com todo zelo, talento e verdade”, completou, para então recitar dois poemas, um de Nhô Bento, dos preferidos de Boldrin e outro do próprio Saulo.
Natural de São Joaquim da Barra, Rolando foi o sétimo entre os 12 filhos de seu Amadeu e dona Alzira. Teve mais de 60 anos de carreira na televisão. Também gravou vários discos, trabalhou no rádio e também fez cinema, como nos longas Doramundo e O Tronco, ambos de João Batista de Andrade, e em O Filme da Minha Vida, de Selton Mello.
Além disso, lançou em 2004 o projeto Vamos tirar o Brasil da gaveta, com 102 faixas em oito CDs: quatro de música caipira, dois de samba, um de música regional e outro com declamações. Boldrin era bom de declamar e um exímio contador de causos.