15/02/2024
Reproduzimos, a seguir, publicação do jornalista Mauro Ferreira, no portal g1.
(*) Mauro Ferreira, jornalista carioca que escreve sobre música desde 1987, com passagens em ‘O Globo’ e ‘Bizz’.
Compositor que modernizou o samba-enredo a partir da segunda metade dos anos 1960, com melodias e letras menos caudalosas, Martinho da Vila coleciona obras-primas do gênero em 86 anos de vida, festejados na segunda-feira, 12 de fevereiro.
Há 40 Carnavais, a escola de samba Unidos de Vila Isabel desfilou com um dos maiores sambas-enredos da obra do compositor fluminense e de toda a história do gênero, Pra tudo se acabar na quarta-feira, samba engenhoso, criado com melodia tão envolvente que Martinho abriu mão do refrão.
Joia da safra do Carnaval de 1984, Pra tudo se acabar na quarta-feira é samba apresentado em 1983 – nas vozes de Gera, Marcos Moran e Valcy, então intérpretes da Vila Isabel – no disco dos sambas-enredos do desfile do Grupo Especial do Carnaval do Rio de Janeiro em 1984.
Nessa pérola, Martinho fala poeticamente da paixão com que os foliões constroem ao longo do ano, em mutirão, a ilusão do Carnaval. A mesma ilusão que alimenta a “quaresma colorida lá do morro” quando, finda a folia, se impõe a razão da “vida tão real da quarta-feira”.
Gravado pelo autor no álbum Martinho da Vila Isabel (1984), lançado há 40 anos, Pra tudo se acabar na quarta-feira foi regravado por Martinho da Vila na antologia Escolas de samba – Enredos – Vila Isabel (1993), com a participação de Gera, e nos álbuns Conexões (2003) – em dueto com a atriz Denise Fraga – e Enredo (2014).
(Reprodução / Capa do álbum ‘Martinho da Vila Isabel’, de 1984)
♪ Eis nesta Quarta-Feira de Cinzas, 14 de fevereiro, a letra do samba-enredo Pra tudo se acabar na quarta-feira (1984), atestado da grandiosidade da obra de Martinho da Vila Isabel:
“A grande paixão
Que foi inspiração
Do poeta é o enredo
Que emociona a velha-guarda
Lá na comissão de frente
Como a diretoria
Glória a quem trabalha o ano inteiro
Em mutirão
São escultores, são pintores, bordadeiras
São carpinteiros, vidraceiros, costureiras
Figurinista, desenhista e artesão
Gente empenhada em construir a ilusão
E que tem sonhos
Como a velha baiana
Que foi passista
Brincou em ala
Dizem que foi o grande amor de um mestre-sala
O sambista é um artista
E o nosso Tom é o diretor de harmonia
Os foliões são embalados
Pelo pessoal da bateria
Sonho de rei, de pirata e jardineira
Pra tudo se acabar na quarta-feira
Mas a quaresma lá no morro é colorida
Com fantasias já usadas na avenida
Que são cortinas, que são bandeiras
Razão pra vida tão real da quarta-feira
É por isso que eu canto…”